Quando eu era aluno da USP, na segunda metade dos anos 80, um dos cantores mais tocados nas festas da geografia era Raul Seixas. E uma das músicas dele que quase sempre tocava era Sociedade alternativa. Eu gosto dessa música do Raul (entre outras dele), cuja letra diz:
Viva a sociedade alternativa
Se eu quero e você quer
Tomar banho de chapéu
Ou esperar papai noel
Ou discutir Carlos Gardel
Então vá!
Faz o que tu queres
Pois é tudo da lei!
Da lei!
Na época, a esquerda universitária era pautada principalmente pelas teorias econômicas marxistas, mas, como também tinha incorporado a cultura do sexo, drogas e rock and roll, legada pela geração de 68, nutria muita simpatia pela ideia de um modo de vida hippie, ou seja, com pouco trabalho, pouco consumo e liberdade para viver como se deseja.
E hoje? Bem, a esquerda não abandonou as velhas críticas econômicas ao capitalismo, mas suas pautas políticas estão muito mais atreladas ao politicamente correto e ao identitarismo. Resultado: segundo uma "Nota de Esclarecimento" divulgada em 2014 pelo Centro Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários - Caell, da USP, houve um conflito durante uma festa a fantasia organizada por esse Centro. O problema começou quando travestis militantes de um "coletivo" que luta pelos direitos dos transgêneros acusou três alunos gays de desrespeito e discriminação porque estes estavam fantasiados de Sailor Moon. Os rapazes acusados tiraram as fantasias em público, no meio da festa, tal como os travestis exigiram, mas estes não sossegaram. Segundo afirma o Caell, as discussões com os travestis militantes continuaram até chegar o ponto em que estes últimos exigiram que a festa fosse encerrada imediatamente e que as mulheres do Centro, que eram as responsáveis pela organização, fizessem um mea culpa diante de todos os presentes, confessando que a gestão do Caell era transfóbica, homofóbica e machista (oi?)! Mas, como os integrantes do Caell se recusaram a atender às exigências, os travestis chamaram a polícia militar...
Paro aqui a descrição dos acontecimentos narrados pela nota do Caell, a qual está disponível na internet para quem quiser ler. Afinal, o que está dito acima já é suficiente para eu fazer alguns apontamentos. O primeiro deles é que a esquerda universitária dos anos 80 falava em democracia e em liberdade de costumes, mas queria transformar o Brasil numa nova Cuba, país onde não existem nem uma coisa, nem outra. O segundo é que a esquerda atual só fala em combater preconceitos, mas, quando os militantes se reúnem para festejar, quem age como desmancha prazeres e estraga festa não são os "caretas" de antigamente ou a direita religiosa atual, mas sim os próprios militantes identitários, cuja intolerância é inegável
Encerro dando um aviso de quem já conviveu com muitos militantes universitários e que ainda observa a atuação deles, agora na qualidade de professor: quando virem esse pessoal curtindo o trabalho bem humorado de artistas como Raul Seixas, não se deixem enganar: ontem como hoje, esquerdistas radicais costumam ser gente mal humorada, intransigente, intolerante e preconceituosa. O humor que melhor se encaixa no perfil deles é o do Porta dos Fundos mesmo...
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