quinta-feira, 19 de março de 2015

Quando campanha pelo impeachment é golpe e quando não é

Um leitor mandou um comentário ao post anterior, que trata do possível impeachment de Dilma Rousseff, e eu avaliei que a resposta que escrevi merecia estar num post próprio.

Quando lemos o documento "Denúncia por Crimes de Responsabilidade Contra o Sr. Presidente da República, Fernando Affonso Collor de Mello", que serviu de base para a votação que derrubou ele, fica claro que já existem razões mais do que suficientes para, no mínimo, abrir investigação contra Dilma Rousseff. O documento citado está aqui:

De fato, a denúncia contra Collor alegou que: "O impeachment não é uma pena ordinária contra criminosos comuns. É a sanção extrema contra o abuso e a perversão do poder político. Por isso mesmo, pela condição eminente do cargo do denunciado e pela gravidade excepcional dos delitos ora imputados, o processo de impeachment deita raízes nas grandes exigências da ética política e da moral pública, à luz das quais hão ser interpretadas as normas do direito positivo".


Então, se o PT apoiou o impeachment de Collor e agora fala em "golpe", temos aí nada mais nada menos que a enésima demonstração de hipocrisia suja típica de políticos e simpatizantes do PT. Afinal de contas, o "petrolão" sangrou cerca de R$ 21 bilhões da Petrobrás, segundo estimativas baseadas nas delações premiadas, as quais informaram também que parte substancial desse dinheiro foi embolsado pelo partido no poder, inclusive para financiar a campanha eleitoral de Dilma. 

Já existem motivos de sobra para investigar Dilma do mesmo modo que Collor foi investigado: quebra de sigilos fiscal, telefônico e bancário. E, se confirmada alguma das mil denúncias já arroladas oficialmente, abrir processo de impeachment com as mesmas alegações de motivos feitas em 92.

Golpe é isso

Além disso, cumpre dizer que o "Fora FHC" não foi simplesmente "um lema, uma palavra de ordem de sentido simbólico e não efetivo", conforme você escreve, leitor. Quando veio a crise econômica de janeiro de 1999, Tarso Genro apareceu na televisão pedindo a renúncia de FHC por suposta incapacidade para continuar governando. Nessa época, conforme frase que eu reproduzi na barra lateral do blog, José Dirceu e outros políticos petistas defendiam abertamente que FHC deveria renunciar ou então ser submetido a processo de impeachment, posto que a crise estaria tornando o país ingovernável!

Portanto, quando as milícias fascistoides do PT, CUT, MST, UNE e outros "movimentos sociais" bradavam "Fora FHC" nas ruas, era no intuito de convencer a opinião pública de que o país estava ingovernável mesmo para forçar FHC a renunciar ou o Congresso a abrir processo de impeachment.

Então, se nunca chegou-se a abrir processo de impeachment contra FHC, foi porque não havia denúncia de corrupção à época que justificasse isso e também porque a conversa de ingovernabilidade era uma mentira que não colou. O "Fora FHC" foi uma tentativa de golpe, sem sobra de dúvida, mas, como ninguém comprou a ideia de ingovernabilidade, os hipócritas ficaram só no grito.

E dizer que existe um movimento crescente e significativo de pessoas pedindo intervenção militar é falso. São grupos absolutamente minoritários e inexpressivos. Ademais, conforme pesquisa publicada no livro A cabeça do brasileiro (já comentado neste blog) aqueles que tendem a ser mais tolerantes com a corrupção e mais favoráveis à censura à imprensa são as pessoas de baixa escolaridade. Justamente o grupo que elegeu Dilma e que menos tem comparecido às ruas para protestar contra o governo!

Portanto, se quisermos defender a democracia e o Estado de Direito, o brado que deve ecoar mais alto nas passeatas é este: "Fora, Dilma". Nenhum grupo golpista vai se beneficiar disso, pois, na hipótese de as investigações serem feitas, e provarem o mal feito, o novo presidente será Michel Temer, do mesmo modo que o presidente empossado depois da queda de Collor foi o Itamar Franco.

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3 comentários:

  1. Olá Diniz, você tem razão, e me faltou uma pesquisada básica antes de efetivar o comentário, o qual fiz de memória (era um adolescente querendo ter consciência e começar a votar no fim dos 90). Me parece que o movimento "Fora FHC" era uma tentativa golpista mesmo de enfraquecer o governo, e fico na dúvida se talvez não tenha sido bem sucedida em certa medida (no sentido de desgastar o governo). E existem mesmo motivos suficientes para investigar a Dilma, espero que isso seja feito (embora não acredite muito), mas não ainda para pedir impeachment, mas ok, o movimento nas ruas não segue a burocracia jurídica e nem tem que fazê-lo. Acho que ambos os "fora" são apressados, e o que você apontou, creio, de fato coloca-os em pé de igualdade nesse sentido (veja que me refiro a pedir impeachment, não investigações). De qualquer maneira, até aqui penso que sua análise é perfeita. O único ponto que de fato discordo é a negação de que o fundamentalismo político de direita exigindo intervenção militar não esteja numa crescente atualmente no país. São de fato minoritários, mas não inexpressivos e, de qualquer modo, o mais importante é que são cada vez mais notáveis. Outra coisa é que não acho que o fato de as pessoas de baixa escolaridade serem as que têm maior tendência à tolerância com corrupção e autoritarismo, conforme afirma a pesquisa citada, tenha muito a ver com o movimento pedindo intervenção, no sentido de que não dá para concluir nada a partir dessa relação, por exemplo, sobre a escolaridade dos envolvidos ou sobre o que eles querem com isso – não dá para “aplicar” o resultado da pesquisa ali, ao menos ao me parece por enquanto. Obrigado pela atenção. Abraço;

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    1. Concordo que o "Fora FHC", embora não tenha funcionado como golpe para derrubar FHC, funcionou bem como estratégia para desgastar a imagem do presidente e carrear votos para Lula.

      Mas devo dizer que o "Fora Dilma" não pode ser comparado com o "Fora FHC" de modo algum. Isso porque, ao contrário do que aconteceu em 99, agora já existe uma tonelada de evidências que tornam legítimo clamar pelo impeachment mesmo sem as investigações adicionais que eu espero que sejam feitas. É o que se vê pela análise que Ives Gandra Martins, advogado constitucionalista, fez do caso:

      "[…] há elementos jurídicos para que seja proposto e admitido o ‘impeachment’ da atual presidente da República, Dilma Rousseff, perante a Câmara dos Deputados e Senado Federal, pelos fundamentos expostos no presente parecer".

      "[…] o assalto aos recursos da Petrobras, perpetrado durante oito anos, de bilhões de reais, sem que a Presidente do Conselho (Dilma presidiu o conselho de administração da Petrobras) e depois Presidente da República o detectasse, constitui omissão, negligência e imperícia, conformando a figura da improbidade administrativa, e enseja a abertura de um processo de impeachment".

      Por fim, a pertinência dos dados da pesquisa que eu citei está no fato de que as pessoas que estão saindo às ruas para protestar contra Dilma são as de maior escolaridade, ou seja, as que tendem a ser mais exigentes em termos de ética política e mais favoráveis à democracia. É uma evidência a mais para demonstrar que os que pedem ditadura nas passeatas não representam nenhuma parcela expressiva da população. Talvez eles representem melhor a visão dos que votaram em Dilma (os de baixa escolaridade), justamente os que não estão indo para as ruas, ao menos por enquanto.

      E não é verdade que haja um movimento crescente em favor de uma ditadura militar. Os minoritários continuam minoritários.

      Aliás, é interessante que, quando a extrema esquerda arma "manifestações" que viram depredações (como se viu no caso do Movimento Passe Livre, em 2013) a imprensa não pára de repetir que a violência parte de meia dúzia de baderneiros, nada tendo a ver com as ideias da esquerda radical. Mas, se meia dúzia de pessoas levantam bandeiras em favor da ditadura militar (e são vaiadas pelos demais), ainda assim a imprensa insiste em mostrá-los como se houvesse um perigo real de golpe militar no país.

      Se Dilma cair, o presidente será Michel Temer, tal como Itamar sucedeu a Collor. Não há nem sombra de possibilidade de um golpe militar.

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  2. Luis Lopes, poderia citar alguns livros bons (sem ou com pouca doutrinação) de geografia do ensino fundamental e médio, e também alguns que são definitivamente ruins (doutrinários)? Pergunto para avaliar algumas escolas, se puder citar livros mais usados.

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