quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

Atila Iamarino presta desserviço à ciência e à democracia

Em março do ano passado, Atila Iamarino divulgou projeções erradas sobre números de casos e de mortes por covid no Brasil. Depois, caiu em contradição ao tentar explicar por que os números reais não bateram com a previsão. No começo de maio, usou um estudo diferente para concluir que tinha sido "muito otimista" ao prever que haveria mais de 1 milhão de mortes até final de agosto se não fossem adotadas as medidas que ele recomendava. Errou de novo e, em junho, mesmo tendo finalmente admitido o erro, usou uma retórica risível para nos convencer de que os números que ele divulgou, embora errados, continuavam "válidos"! [*]

Ele também diz e repete que as pesquisas científicas já provaram que a cloroquina não é eficaz contra a covid e que pode provocar efeitos colaterais muito perigosos. Curioso, pois a Associação Médica Brasileira - AMB, em comunicado oficial, afirma que os estudos sobre a eficácia desse remédio e seus efeitos colaterais ainda não são conclusivos. A AMB é formada por gente ignorante no assunto e que espalha notícias falsas, ou é Atila Iamarino quem faz isso? 

Agora, Iamarino diz que vacinação obrigatória é "autoritarismo necessário". Ora, mas quem diz que vacinação obrigatória é medida autoritária são justamente aqueles que preferem basear as políticas de combate à pandemia na distribuição de cloroquina! Portanto, Iamarino acabou de dar um argumento para os inimigos da vacinação obrigatória: "até o Atila reconheceu que obrigatoriedade é autoritarismo"...

Não bastasse tudo isso, ele diz que "calar" aqueles que criticam a vacinação é também uma forma de "autoritarismo necessário", e a única coisa que podemos fazer se não for decretada vacinação obrigatória. Ora, estou de pleno acordo que os movimentos anti-vacina são irracionais e que prejudicam a saúde pública, mas discordo da ideia de censurar as pessoas que espalham esses discursos. 

Informações falsas se combatem com a divulgação de informações corretas. Desde o começo da pandemia, Iamarino divulgou projeções erradas às pencas e usou argumentos contraditórios e sem sentido para fazer de conta que tinha acertado, mas acha que, agindo assim, contribuiu com a qualidade dos debates públicos. Na verdade, ele prestou um enorme desserviço à ciência, pois suas previsões furadas e argumentos toscos serviram para a produção de centenas de memes que se espalharam pelas redes sociais e, assim, estimularam a desconfiança em relação às intervenções de cientistas nos debates públicos. 

Resumo da ópera: Atila Iamarino é um divulgador científico que fomenta involuntariamente a desconfiança do público contra os cientistas e que ainda reforça essa desconfiança ao propor censurar quem nega a eficácia das vacinas. 

As pessoas que Iamarino quer censurar realmente andam espalhando ideias perigosas, mas um pesquisador que divulga projeções erradas repetidamente e que usa artifícios retóricos para tentar induzir a população a acatar as recomendações de políticas que ele faz também não é perigoso e autoritário? Afinal, há pesquisas, elaboradas por cientistas renomados, que contestam ou relativizam muito a eficácia das medidas rígidas de quarentena e de lockdown que Iamarino e outros defendem[*]. Mas nem por isso vamos sair por aí dizendo que Iamarino tem de ser censurado. Ele se beneficia da liberdade de expressão que deseja negar aos outros.

[*] Referências