quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Invasores e piqueteiros desejam uma universidade afinada com a "pedagogia progressista"

A invasão de edifícios na UFPR já terminou, mas os invasores usaram as redes sociais (segundo me foi relatado por alunos e professores que usam o Facebook) para prometer que as invasões e piquetes deste ano são só o começo. Mas o que eles querem? Simples: querem impor pela força um modelo de universidade que, afinado com as ideias de autores como Paulo Freire e Pedro Demo, se apoia em dois pilares: a ideologização e partidarização dos conteúdos das aulas, de um lado, e a institucionalização do pacto de mediocridade, de outro.


A melhor demonstração do primeiro elemento está nas exigências que os invasores do Edifício João José Bigarella, da UFPR, fizeram aos professores, alunos e funcionários que precisavam usar esse espaço. Em e-mail, afirmaram que o acesso ao Edifício estaria restrito ao período da tarde e, mesmo assim, condicionado a pedido prévio de autorização, o qual seria discutido pelos invasores e, conforme a vontade deles, negado ou não. Logo em seguida, disseram o seguinte a respeito das solicitações: 
Em contrapartida, deixamos a sugestão que os professores que quiserem utilizar os laboratórios, proponham atividades nos horários de suas aulas, preferencialmente relacionadas a conjuntura atual e aos acontecimentos que influenciam nosso cotidiano (sugestão de temas em anexo) [...].
Essa passagem é de um cinismo sem paralelo! Afinal, depois de roubar a liberdade de trabalhar e de ir e vir dos professores, eles ainda fizeram a "sugestão" de que estes entregassem, "em contrapartida", também a liberdade de ensinar! Usurpam uma liberdade e fingem devolvê-la parcialmente para tomarem ainda mais liberdade dos outros!

Mas o essencial não é destacar o autoritarismo e o cinismo dos métodos e discursos utilizados pelos invasores, e sim o projeto de universidade ali expresso: uma privatização do espaço público a serviço da ideologização e partidarização máximas dos conteúdos ensinados, posto que, dentro da enorme lista de "sugestão de temas" que os invasores enviaram, aqueles incluídos entre os preferenciais são os que dizem respeito à "conjuntura atual", tais como: "Reforma do ensino médio" e "Dívida Pública, Fundo Monetário Internacional" (sic).

Já o segundo elemento desse modelo autoritário de universidade que tem afinidade com as ideias da "pedagogia progressista" fica bastante explícito num comentário que um professor fez ao post Cabeça de aluno "grevista":
Luis, se você, de alguma forma, conseguiu lecionar, já é uma vitória. Eu não consegui nem entrar no prédio onde trabalho. Se entrasse, provavelmente haveria violência (referindo-me ao seu outro post). Agora, com a "greve" quase finda, os estudantes exigem reposição das aulas e uma avaliação excepcional que seja leniente o bastante, e arrogam-se o direito de discordar da avaliação do professor, contra eventuais "irregularidades" e "injustiças". Essas "injustiças" incluem dar trabalhos e leituras durante a greve, além de serem caracterizadas por uma avaliação subjetiva do dito professor, já que uma das exigências é incluir, na avaliação dos estudantes, uma autoavaliação do aluno e uma avaliação do próprio curso feita pelos alunos, para compor a nota. Inclusive foi simplesmente declarada a possibilidade de o aluno que se sentir prejudicado entrar com uma "ação" (!) contra o professor em um recém-criado "comitê pós-greve" para eventual correção da nota. Alguns professores, justificadamente, ficaram estupefatos com essas exigências (embora não tenha havido manifestação institucional séria contra esses ultimatos), mas duvido que algo vá mudar para além da "cordialidade" de sempre.
De fato, eu tive sorte, pois, como o prédio onde eu dou aula não foi invadido, consegui até aplicar provas - embora tenha adotado um sistema semi-presencial (diurno) e não presencial (noturno) para evitar os piquetes. Mas o interessante no relato do professor é que, com a desculpa de evitar "injustiças", os alunos querem impor um modelo de avaliação no qual eles avaliam a si próprios, ao curso e também aos professores! Se estarão ou não bem preparados para exercer funções profissionais no dia em que tirarem o diploma, é algo que eles mesmos devem dizer à sociedade. E quem quiser acreditar neles que acredite!

E, se alguém acha que estou forçando a barra em associar esse tipo de reivindicação às ideias de autores como Paulo Freire ou Pedro Demo, experimente ler o post Comentários de uma leitora ilustram a fragilidade da "pedagogia progressista".

Postagens relacionadas

2 comentários:

  1. Diniz, eu me dei ao trabalho de buscar no próprio Paulo Freire um excerto que mostra quão autoritário é o seu pensamento supostamente progressista: "só, na verdade, quem pensa certo, mesmo que, às vezes, pense errado, é que pode ensinar a pensar certo" - Freire, P. (1996). Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Tempo (p.30).
    i) Em primeiro lugar, se ele parte do princípio de que existe uma forma de pensar "certa" e outra "errada" (maniqueísmo muito ao gosto dos esquerdistas "progressistas", diga-se de passagem), ele está assumindo que existe uma forma de pensar certa, que é a sua. Logo, todo professor que busque ensinar de forma diferente da que ele propõe é classificado como "errado";
    ii) ao propor que o professor ensine a pensar "certo", ele também propõe que os alunos sejam educados de modo a se adequar a um padrão, tido como o ideal. Assim, fica a pergunta: onde está a "autonomia", o "pensar crítico", a "abertura ao diálogo"? Pelo contato que tenho com seguidores desse tipo de pensamento, só é possível dialogar com essas pessoas se seus dogmas não forem colocados em xeque.
    Quanto às propostas dos alunos, ainda não estamos tão mal assim. Estive na Universidade Nacional de La Plata na semana passada, para participar de um evento, e fiquei surpreso - para dizer o mínimo - ao saber que a universidade não dispõe de restaurantes porque os alunos não querem. Sim, é isso mesmo: os alunos não querem comércio privado na universidade e, por isso, quem não concorda com seu pensamento "revolucionário" não pode se alimentar da forma como quer. Espero que as universidades públicas do Brasil não se prostrem dessa forma a esses alunos protoditadores, mas, do jeito que as coisas vão, não estou muito otimista.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Perfeito, Jonathan! É por isso que, como eu já defendi num artigo publicado na Gazeta do Povo, Paulo Freire e seus seguidores fazem educação bancária com conteúdo ideológico, na medida em que ensinam aos alunos ideias prontas e acabadas por meio de um diálogo manipulado pelos freirianos, que sonegam aos alunos os conhecimentos científicos que contradizem as ideologias toscas em que os freirianos acreditam!

      Por fim, o relato que você fez sobre a Universidade Nacional de La Plata é simplesmente estarrecedor! Sempre é possível decair mais do que já decaímos...

      Excluir

Seu comentário foi enviado e está aguardando moderação.