sexta-feira, 7 de março de 2014

Oito verdades incômodas sobre economia de mercado, agricultura e ecologia

Ao responder a um comentário que atacava a agricultura patronal e o uso de agrotóxicos, dei-me conta de que os esclarecimentos que fiz mereciam um destaque maior aqui no blog, pois batem de frente com uma série de ideias tão contraditórias e equivocadas quanto difundidas na academia e nos meios de comunicação. Vejamos: 


1 – É verdade que um capitalista pode investir em melhorias ambientais visando apenas ganhar dinheiro com isso. Essa é a razão de o capitalismo ser um bom sistema de produção e distribuição de mercadorias: quem investe para lucrar acaba beneficiando os outros.

2 – É falso dizer que os grandes capitalistas não se interessam pelos custos de externalidade e investem visando só o lucro imediato. Se os consumidores se dispuserem a pagar os custos acarretados pelas práticas de conservação ambiental, o lucro das empresas fica inalterado, ou pode até aumentar. Evidência disso está no post Capitalismo é ecológico quando os consumidores assim desejam, como prova o agronegócio

3 – Agricultores familiares agroecológicos também são capitalistas. Afinal, eles investem dinheiro na produção com o fim de ganhar mais dinheiro. Se usam a maior parte dos seus lucros para consumir, em vez de acumular capital, isso não muda o fato de que investem para obter lucros, assim como qualquer pequeno industrial ou dono de oficina mecânica, por exemplo. Além do mais, se os produtores de orgânicos usam tecnologias que implicam o mínimo de alteração do meio ambiente, é para poderem vender um produto diferenciado e obter margens de lucro maiores reduzindo custos de produção e/ou pela elevação dos preços dos seus produtos. 

4 – Sou contra subsídios à produção. Tanto faz se é para a agricultura convencional ou para a agroecologia. Um erro não justifica outro, logo, é errado dizer que a agroecologia merece receber dinheiro público porque os grandes produtores que operam com o pacote tecnológico da revolução verde também recebem.

5 – Além disso, é falso falar como se pequenos e médios produtores familiares não recebessem ajuda dos governos. O Pronaf está aí para provar que, desde 1995, a agricultura familiar brasileira vem recebendo financiamentos a juros até que bem camaradas – e isso sem falar em certos produtores familiares que desviam o dinheiro para fins não produtivos. Enquanto isso, na Europa, já desde 1992, a política de subsídios consiste em dar dinheiro para agricultores familiares não produzirem! Essa lógica de ficar doando dinheiro para quem não produz foi reforçada, nos anos 2000, pela aplicação de subsídios baseados no conceito de "multifuncionalidade do rural", conforme já expliquei aqui.

6 – O autor do comentário citou vários exemplos de problemas ambientais recentes na tentativa de provar que não se deve fechar os olhos para os custos acarretados pela indústria ou pela industrialização da agricultura, tais como o desastre nuclear em Fukushima, o mal da "vaca louca" e o uso de amianto. Mas o problema é que tais exemplos não invalidam em nada as afirmações que eu já fiz neste blog, quais sejam: o uso controlado de agrotóxicos não faz mal à saúde humana e não existe nenhum consenso científico de que os alimentos naturais sejam mais nutritivos do que aqueles produzidos pela agricultura convencional (ver aqui).

7 – Criticar a indústria moderna citando exemplos de problemas ambientais não anula o fato de que os ganhos trazidos pela modernização tecnológica são muito maiores do que os problemas que a acompanham, os quais podem e têm sido solucionados com aprimoramentos tecnológicos, mudanças nos hábitos dos consumidores e regulação pública. Podem dizer o que quiserem sobre energia nuclear, transgênicos e agrotóxicos, pois o fato inconteste é que a esperança de vida hoje é muito mais alta do que era há um século e não pára de subir em quase todos os países do mundo. 

8 – Citar esses exemplos como se houvesse alternativas tecnológicas capazes de produzir os mesmos resultados sem "agredir o meio ambiente" significa reproduzir a demagogia dos defensores radicais da agricultora orgânica, a qual consiste em repudiar a agricultura convencional como se a agroecologia pudesse produzir com alta produtividade. Se toda a agricultura do mundo fosse ecológica, estaríamos todos passando fome, isso sim!

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