quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Márcio Pochmann tapeia até quando diz uma verdade. Ou: reformas já!

Neste ano de 2014, quando os petistas que ocupam a prefeitura de São Paulo provaram do mesmo veneno que os pelegos da CUT usam contra os adversários políticos do PT (uma greve de motoristas imposta por meios violentos e com exigências salariais absurdas), vale a pena lembrar uma entrevista de Márcio Pochmann a propósito da estrutura de  impostos do Brasil, com destaque para o aumento do IPTU na capital paulista (ver aqui).


A entrevista começa com perguntas nas quais a entrevistadora embute mentiras que são confirmadas por Pochmann na maior cara de pau, como a de que o processo de desconcentração de renda dos últimos anos teria começado com Lula, graças ao Bolsa Família. Qualquer pessoa bem informada sabe que esse processo começou em 1995 e que os programas de transferência de renda que deram corpo ao Bolsa Família foram instituídos por FHC, em 2001. E as bolsas nem sequer foram o fator preponderante na queda da desigualdade, como reconhecem até mesmo os economistas mais entusiastas desse programa!

Depois, finalmente, Pochmann conta uma verdade. Ele diz que uma das causas da desigualdade está no fato de que, no Brasil, os pobres pagam proporcionalmente mais impostos do que os ricos. O gráfico abaixo confirma plenamente essa afirmação:

Fonte: LANZANA; LOPES, 2009

A razão disso, segundo os autores, é a seguinte: 
[...] presença muito forte de impostos indiretos [como ICMS, que incide sobre o consumo] e perda de progressividade dos impostos diretos por causa de abatimentos e deduções.
A distorção verificada no Brasil é típica de países que apresentam reduzida capacidade de arrecadação, tornando mais intensivo o sistema em impostos indiretos que não são declaratórios e, portanto, de mais fácil controle. Somente países com fiscalização mais rígida conseguem extrair do contribuinte uma porcentagem maior de arrecadação via impostos declaratórios, como é o caso do Imposto de Renda, por exemplo (Lanzana; Lopes, 2009).
Mas Pochmann é daqueles intelectuais petistas que mentem para o bem do partido e que só dizem uma verdade se for também no interesse do partido! Indagado sobre os caminhos para continuar reduzindo a concentração de renda, ele começou a defender a política de elevação do IPTU encetada no município de São Paulo, em 2013, sob a gestão do petista Fernando Haddad.

Por que isso é tapeação? 

Porque a motivação de Haddad para tentar fazer o IPTU subir 52% em quatro anos era cobrir o rombo deixado pela suspensão do aumento das tarifas de ônibus em 2013, suspensão essa que nada mais foi do que uma resposta covarde do prefeito petista às depredações ocorridas a partir da primeira manifestação convocada pelo Movimento Passe Livre, em junho daquele ano.

Nesse sentido, os bilhões de Reais de arrecadação adicional esperados com aquele aumento do IPTU em São Paulo já estavam comprometidos pela decisão do prefeito de ceder aos fascistoides que vandalizaram a cidade, não podendo, portanto, ser usados em políticas sociais! E a suspensão do aumento da tarifa em nada contribuiu para reduzir as desigualdades de renda, por dois motivos: a) o que mais encarece as passagens de ônibus, no Brasil, é o elevado número de pessoas que não pagam tarifa ou que pagam com desconto (Cf.: Estimativa dos Custos de Transporte em Curitiba); b) as maiores beneficiadas com essa medida foram as empresas privadas, que são obrigadas por lei a pagar vale transporte. 

A queda da concentração de renda iniciada em 1995 foi determinada principalmente por transformações demográficas e no mercado de trabalho e pelo fim da crise inflacionária - que só foi possível graças à abertura da economia, aliás. Em menor grau, contribuíram as políticas de transferência de  renda, o avanço da escolaridade, as privatizações e a combinação de juros altos com valorização cambial (Loch; Diniz Filho, 2014; Osório; Soares, 2006). 

Se o PT quisesse dar uma real contribuição para acelerar a queda da desigualdade, retomaria a agenda de reformas que foi quase completamente abandonada com a chegada do PT ao poder e que sempre foi hostilizada por gente como Pochmann: abertura da economia, reforma tributária, reforma trabalhista, etc. Em vez disso, o partido continua a seguir a lógica populista de dar com uma mão e tirar com a outra, já que amplia a carga tributária para financiar aumentos inúteis do salário mínimo, distribuição de mais bolsas e aumentos do subsídio de tarifas de ônibus!

Finalmente, vale lembrar que, como a carga tributária já está alta demais, o objetivo de reformar a estrutura de impostos não pode ser apenas corrigir a sua regressividade, mas também o de conter o aumento da arrecadação como proporção do PIB ou, de preferência, reduzir a carga! 

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LOCH, F. A. S.; DINIZ FILHO, L. L. O Brasil na globalização: crítica à perspectiva de Milton SantosRevista Geografar, v. 9, n. 1, p. 65-99, jun. 2014.

LANZANA, A. E. T.; LOPES, L. M. Economia brasileira: da estabilização ao crescimento. São Paulo: Atlas, 2009.

OSÓRIO, R. G.; SOARES, S. S. D. Desigualdade e bem-estar no Brasil na década da estabilidade. In: BARROS, R. P.; FOGUEL, M. N.; ULYSSEA, G. (org.). Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente. Brasília: Ipea, v. 1, 2006.

2 comentários:

  1. Bom Diniz, cometi um equívoco, os "pobres" pagam impostos. Veja: http://brasildebate.com.br/quem-paga-imposto-no-brasil/

    Até mais.

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