Fazendo uma pesquisa no Google, esbarrei com uma Carta Aberta para que a Universidade Continue Sendo um Espaço de Debate de Ideias. A carta foi assinada pelo Coletivo de Estudos sobre Conflitos pelo Território e pela Terra - ENCONTTRA, e publicado num blog em 27.03.2017.
A dita carta faz uma crítica a um post que eu publiquei neste blog, a saber: Professora da UFPR defende ensino doutrinador, mas diz que doutrinação não existe. Nesse post, eu fiz uma crítica às ideias expostas pela professora Mônica Ribeiro da Silva durante um debate realizado sobre a reforma do ensino médio, o qual acabou tratando também do movimento Escola Sem Partido - ESP. A minha crítica é a de que existe uma incoerência lógica nos argumentos da professora, a qual afirma não haver doutrinação no ensino brasileiro, mas, ao mesmo tempo, baseia-se num conceito marxista de ideologia como falsa consciência da realidade para propor que a escola cumpra um papel desideologizador. Nesse sentido, a professora afirma não haver doutrinação, mas propõe que a escola tem a função de inculcar na cabeça dos alunos que as teorias críticas do capitalismo são verdades científicas e que toda afirmação em contrário deve ser vista como uma mentira, uma ideologia útil a interesses de classe particulares.
Acusação sem prova
Muito bem. Qual foi o argumento que o ENCONTTRA apresentou em sua Carta para se opor à minha crítica? Nenhum! O que o Coletivo ou Grupo de Pesquisa escreveu foi isto:
[...] fomos informados pela profª. Mônica Ribeiro da Silva que o prof. Luís Lopes Diniz Filho, docente do curso de Geografia, que estava entre o público presente na ciranda, fez uma postagem no seu blog no qual fazia ataques pessoais à professora. A postagem ocorreu no dia 14 de março (ver no endereço do Blog Tomatadas: http://tomatadas.blogspot.com.br/) e foi publicado em outro blog de forma mais ofensiva ainda no dia 21 do mesmo mês (ver no endereço do Blog Vista Direita: http://www.vistadireita.com.br/blog/professoradoutrinadora-da-ufpr-e-pega-no-pulo/).
Ora, já que eles ignoraram o que eu escrevi e fizeram eco à acusação da professora de que eu teria agido de forma ofensiva, por meio de ataques pessoais, o mínimo de honestidade intelectual que se poderia esperar do Coletivo era que reproduzisse as passagens do meu texto que conteriam as supostas ofensas e ataques, não é mesmo? Mas a honestidade passou longe da tal Carta! Em vez de provarem a acusação que fizeram, prosseguiram dizendo isto:
[...] em nossa avaliação, as ações realizadas pelo prof. Diniz Filho não contribuem para o bom, amplo e livre debate e fortalecimento da democracia institucional. Pelo contrário, prejudica a todos, inclusive a ele mesmo e ao próprio Departamento e Curso onde trabalha, na medida em que outros profissionais convidados pela casa podem declinar convites para palestras e debates, pois podemter receio de sofrerem ataques pessoais deste tipo. Como o que sofreu a profª. Mônica, com uma exposição pessoal e unilateral nas redes sociais, onde uma única versão é colocada a público, após um debate público.
A passagem acima é mentirosa, hipócrita e incompatível com o espírito do debate acadêmico.
Mentirosa porque eu não fiz nenhum ataque pessoal, o que fica provado pelo fato de o próprio grupo não haver citado qual foi o ataque. Mentem sobre ataques e ofensas que não existiram para desqualificarem minhas ideias, e a mim como debatedor, sem argumentar. E a carta mente também quando afirma que eu expus a professora e de forma unilateral. Na verdade, eu expus as ideias da professora sobre o ESP, isso sim. E, justamente por eu haver reproduzido as ideias que ela expressou durante o debate público em questão, é falsa a acusação de que eu fui unilateral. Eu dei voz à professora, sim - até porque, como eu conseguiria apontar uma incoerência no discurso dela sem antes reproduzir o que ela disse?
Portanto, a professora Mônica e o ENCONTTRA poderiam fazer uma crítica séria e construtiva se demonstrassem que eu reproduzi incorretamente as falas feitas pela professora no debate. No entanto, nem ela, nem o ENCONTTRA apresentaram qualquer reparo ao que eu escrevi sobre isso! Não houve unilateralismo da minha parte e nem distorção.
E a Carta é hipócrita porque condena o unilateralismo, mas, ora vejam, o "debate-ação" (sic) sobre a reforma do ensino médio organizado pelo ENCONTTRA foi claramente unilateral! Eu apontei isso logo no começo do meu post, ao escrever: "como é de praxe nos eventos de Geografia, os três debatedores convidados tinham as mesmas opiniões sobre o tema, informadas por teorias e ideologias de esquerda radicais. Então, só houve debate durante a sessão de perguntas que se seguiu às exposições porque eu participei do evento, visto que, a julgar pelas perguntas não dirigidas a mim, ninguém discordou de nada!".
ENCONTTRA é contra o livre debate de ideias
Finalmente, a carta demonstra que o ENCONTTRA não suporta a crítica acadêmica e o debate de ideias. E digo isso por uma razão muito simples: não há nada mais natural e mais salutar num debate acadêmico do que indicar as fontes consultadas, e isso nada tem a ver com exposição pessoal de um autor. Afinal, se a fonte é um artigo científico, um livro ou uma fala proferida num evento, não há como citar a fonte sem dizer quem é o autor, ora essa! É por isso que, quando algum acadêmico critica meus escritos publicamente, ao invés de me fingir de vítima, eu redijo uma resposta.
Prova inequívoca disso é que a professora Ana Fani Alessandri Carlos fez críticas pesadas a um artigo meu durante uma conferência que ela proferiu num evento internacional (chegou a dizer que eu desconheço o assunto), críticas essas que foram reproduzidas em sites e também em revista especializada. E o que eu fiz? Escrevi uma resposta, a qual saiu publicada no primeiro capítulo do livro Por uma crítica da geografia crítica.
Isso, sim, é fazer um debate acadêmico e democrático de ideias. Então, se algum professor disser que não vem dar palestra no Departamento onde eu trabalho por ter medo de ser criticado no meu blog, fica claro que esse professor, ou tem receio de não saber que argumentos usar para contrapor aos meus, ou é alguém avesso ao debate de ideias, alguém que quer falar sem ser contestado.
Mais imposturas na Carta
Perto do fim, a Carta diz: "é fundamental que debatamos amplamente no nosso Curso
esse tipo de postura antiética".
Ora, se o ENCONTTRA achasse fundamental debater o assunto, bastaria que o professor Jorge Ramon Montenegro, que é coordenador do Grupo de Pesquisa com esse nome, e que era Vice-Coordenador do Curso de Geografia da UFPR na época da publicação da Carta (hoje ele é Coordenador) propusesse isso como tema de pauta de uma de nossas reuniões de Colegiado. Se acaso ele não o fez, é porque o ENCONTTRA não quer debater coisa nenhuma. Ao contrário, querem que eu seja chamado de antiético na internet sem saber que estou sendo acusado disso e sem me dar, portanto, a chance de contra-argumentar.
O ENCONTTRA usa de mentira e difamação para intimidar vozes discordantes dentro da universidade e, ao mesmo, se vale dessas mesmas mentiras e difamações para fazer vitimismo e dizer-se democrático. E não vou nem comentar agora a posição do ENCONTTRA sobre as invasões de escolas e de universidades ocorridas em 2016.
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O objetivo nunca é "fomentar o debate" é censurar o adversário. Um discurso fica com a militância (que muitas vezes é bem agressivo) e o outro vai para o debate público. É na esfera pública que ficam ofendidos e agem de má fé, invertendo o ônus da prova.
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