sexta-feira, 27 de julho de 2012

Nossos economistas regionais também não veem a real importância do território

Se os geocríticos deixam de enxergar a importância verdadeira do território por se preocuparem em fazer do estudo do espaço uma arma de luta contra o capitalismo, como visto no post anterior, os economistas regionais brasileiros usam as teorias da geografia econômica apenas para fazerem discurso ideológico antiliberal e, desse modo, venderem seus serviços como consultores de órgãos de planejamento estatal.


De fato, os principais nomes da economia regional brasileira, como Wilson Cano, Clélio Campolina Diniz - não é meu parente, não - , Leonardo Guimarães Netto, Paulo Roberto Haddad, Tânia Bacelar Araújo e Maurício Borges Lemos, entre outros, passaram as décadas de 1980 e 1990 gritando que, com a crise do Estado e as reformas ditas "neoliberais", o processo de desconcentração econômica que vinha acontecendo desde 1970 iria paralisar-se ou até retroceder. Entre os muitos argumentos que apresentaram para justificar esse prognóstico, há dois que vale a pena destacar aqui. O primeiro é o de que o livre mercado não é capaz de engendrar mecanismos automáticos de redução das desigualdades regionais de renda e nem de assegurar uma alocação espacial ótima dos fatores de produção. O segundo argumento consiste em minimizar os impactos da indústria extrativa mineral e da agropecuária como fontes de crescimento nas regiões "periféricas", posto que esses dois setores tendem a ter participação cada vez menor no PIB nacional. Daí que a atividade econômica tenderia a se concentrar nas regiões mais desenvolvidas, a menos que o Estado executasse políticas regionais ativas (Diniz Filho, 2005).

Legal, mas as estatísticas econômicas invalidaram completamente essa previsão. Os dados referentes à participação das Unidades Federativas no PIB brasileiro, bem como no pessoal ocupado na indústria e no valor da transformação industrial - VTI, provaram que o processo de desconcentração econômica não só teve continuidade como ganhou força a partir do Plano Real. A macrorregião Nordeste, em particular, foi a mais beneficiada com as reformas. De 1987 a 1993, essa região perdeu participação no PIB brasileiro em termos relativos e o valor do seu produto chegou a cair em termos absolutos! De 1994 em diante, porém, o PIB dessa região voltou aos patamares de meados da década de 1980, em termos absolutos, e obteve ganhos de participação relativa. De outro lado, São Paulo e Rio de Janeiro perderam participação no PIB, no VTI e no pessoal ocupado na indústria (Diniz Filho, 2000; 2005).

Por que eles erraram tão feio? Entre outros motivos, porque não tem cabimento pensar a diversidade regional de um "país continente" como o Brasil com base em divisões simplistas entre "regiões mais desenvolvidas" e "menos desenvolvidas". A heterogeneidade regional e setorial do Brasil faz com que os processos de concentração e desconcentração se manifestem sempre de maneira seletiva, em escala sub-estadual. Em segundo lugar, porque o Brasil é um dos poucos países do mundo que ainda tem um amplo fundo territorial a ser explorado, de sorte que a fronteira de recursos naturais possui uma importância muito grande como fonte de crescimento para os estados que apresentam participação muito pequena no PIB nacional. Noutras palavras, a extração mineral e a agropecuária tendem a perder participação relativa no PIB brasileiro, mas seus impactos nos estados do Norte e Centro-Oeste podem ser grandes o suficiente para que estes alcancem taxas de crescimento econômico superiores à média nacional. Não é à toa que o Centro-Oeste vem ganhando participação relativa no PIB com a expansão do agronegócio em regiões de cerrado (Diniz Filho, 2005).

Temos aí mais uma ironia, portanto. Nossos economistas regionais vivem falando da importância de entender a dimensão espacial da economia, mas desprezam as características concretas do território que não servirem ao objetivo de legitimar a intervenção econômica estatal. Assim como no caso da geocrítica, o estudo científico do espaço é subordinado à ideologia, o que resulta em previsões furadas. 

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DINIZ FILHO, L. L. A dinâmica regional recente no Brasil: desconcentração seletiva com "internacionalização" da economia nacional. São Paulo, tese de doutorado em Geografia, FFLCH-USP, 2000.

DINIZ FILHO, L. L. Para onde irão as indústrias? : a nova geografia da industrialização brasileira. In: SILVESTRE, E. A. Que país é esse ? : pensando o Brasil contemporâneo. 1. ed. São Paulo: Globo, 2005.

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