quarta-feira, 12 de outubro de 2011

E Vesentini divulga esse primeiro erro

Basicamente, o ensino fundamental e o médio têm por objetivos transmitir os valores da cidadania, apresentar uma breve introdução a algumas teorias explicativas de fenômenos naturais e sociais e, por fim, desenvolver as habilidades cognitivas necessárias para que os alunos reflitam criticamente sobre essas explicações. Todavia, muito do que vai escrito nos livros didáticos são apenas ideologias políticas apresentadas aos alunos como se fossem verdades evidentes por si mesmas. 


Um bom exemplo disso é o modo como José W. Vesentini vem há décadas divulgando um dos erros fundamentais dos “melancias” no diagnóstico dos problemas ambientais, como visto no último post. O equívoco está em adaptar as censuras do pensamento romântico dos séculos XVIII e XIX contra os efeitos sociológicos da economia de mercado à discussão de temas ambientais. De fato, ao tratar da “questão ambiental”, em seu livro Brasil: sociedade e espaço, esse autor afirma textualmente isto: 
"Por ser um sistema sócio-econômico voltado para o lucro, com a produção de mercadorias, o capitalismo cria nos indivíduos uma mentalidade competitiva, voltada para a disputa. E, para a maioria das pessoas, assim como para as empresas capitalistas, o importante não é o que é bom para todos ou o que é justo, e sim o que lhes dará lucros mais rapidamente, mesmo que a longo prazo isso traga conseqüências negativas para a Humanidade" (Vesentini, 1996, p. 269).
Mas não vou retomar as explicações feitas no post anterior para demonstrar porque essa afirmação está equivocada. Menciono essa passagem do livro de Vesentini visando apenas mostrar que há um problema de legitimação dos conteúdos dos livros didáticos. Esses livros deveriam explicar introdutoriamente algumas teorias científicas amplamente provadas (algo difícil, em se tratando de ciências sociais) e resumir algumas teorias divergentes quando o assunto ainda está em debate acirrado na academia. Na prática, ideologias e preconceitos são apresentados como se fossem verdades comprovadas e até óbvias. 

E os geógrafos têm sido eficientes em divulgar essa visão tosca dos problemas ambientais entre os alunos? Certamente que sim. Não se pode saber ao certo o quanto os livros didáticos e aulas do ensino médio influenciam as visões de mundo dos estudantes, já que outras fontes de informação também colaboram para tanto. Entretanto, uma pesquisa que realizei com 121 alunos do último ano do ensino médio, na cidade de Curitiba, demonstra que a ideia contida na passagem acima citada do livro de Vesentini é aceita como verdadeira por 90,1% dos alunos pesquisados! Quem quiser conhecer detalhes sobre essa pesquisa pode baixar o texto que escrevi sobre o assunto (aqui). 

Não há nada no mundo mais desprovido de senso crítico do que a pedagogia e a geografia críticas! 

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VESENTINI, J. W. Brasil: sociedade e espaço – geografia do Brasil. 26ª ed. SP: Ática, 1996, p. 269.

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