terça-feira, 17 de julho de 2012

Comentários de uma leitora ilustram a fragilidade da "pedagogia progressista"

Uma leitora fez comentários ao post A “outra universidade” de Pedro Demo é ouro dos tolos que ilustram muito bem a fragilidade das ideias próprias dessa pedagogia progressista que encanta os educadores brasileiros. Por conta disso, resolvi escrever este post para responder aos questionamentos dela (em negrito), conforme segue: 

Caro Luis, você diz que o texto não apresenta propostas efetivas para a solução do problema levantado. Tenho para mim que a apresentação do diagnóstico e a reflexão sobre as motivações e circunstâncias nele encontradas já são bastante útil na construção “coletiva” de soluções – pois essas seriam contextuais, particulares, de acordo com cada caso. Você acredita na possibilidade de um estudioso propor uma “receita”, acredita que uma proposta com esse caráter seria eficaz de alguma forma? Aguardo suas considerações.

Quem faz um diagnóstico catastrofista do que está posto, clama por uma "revolução", mas não tem propostas claras a fazer para realizá-la não passa de um demagogo. No caso, se Pedro Demo não sabe dizer ao certo o que deve ser feito para integrar ensino e pesquisa, é sinal de que também não sabe o que está dizendo quando fala sobre essa integração. 

E, se ele não sabe o que significa de fato integrar ensino e pesquisa, não se pode dizer que tenha feito um diagnóstico preciso dos problemas da educação (na verdade, ele faz um diagnóstico errado, conforme eu comento ao citar a Prova Brasil). Daí que esse autor não fornece subsídio nenhum para a construção de soluções por meio de debates coletivos: ele joga no ar uma ideia demagógica (a de que a universidade só será boa quando o "instrucionismo" for substituído por alguma coisa que ele mesmo não sabe como seria) e deixa os outros perderem tempo lendo e discutindo os textos repetitivos que ele escreve. Aliás, é como eu disse: essa ideia jogada no ar não é nem sequer original; a rigor, já estava tudo em Paulo Freire. 

Para considerar os resultados da Prova Brasil como dado relevante nesse contexto, seria preciso estar de acordo com o formato da prova, sua elaboração, enfim, considerar que trata-se de um instrumento de avaliação legítimo. Mais ainda, seria preciso considerar que aquilo que é objeto de avaliação por esse instrumento é digno de consideração. 


Se milhares de alunos fazem uma mesma prova de conhecimentos e obtém resultados distintos, não há dúvida de que alguns deles têm um nível de conhecimento superior aos de outros. Nesse sentido, testes como a Prova Brasil têm, sim, legitimidade, já que, ao aferirem o domínio que cada aluno alcançou em determinado conteúdo, permitem identificar os métodos de ensino mais eficientes. No caso em questão, você acha que é só por coincidência que os alunos que estudam com apostilas tiram notas melhores na Prova Brasil do que aqueles que não usam esse tipo de material didático? A estatística está aí para provar que não é coincidência: as apostilas, ao contrário do que pensa Demo, são um bom recurso didático. 

Portanto, questionar o "formato" ou a forma de elaboração de um teste pode ser válido na medida em que vise aperfeiçoar sua capacidade de aferir o nível de conhecimento dos alunos, mas não serve de argumento para dizer que tal instrumento não é "legítimo", pois a estatística prova que é, sim! 

Agora, negar que "aquilo que é objeto de avaliação por esse instrumento [seja] digno de consideração" implica afirmar que a sociedade não precisa se preocupar em saber o quanto os alunos aprendem na escola. Mas, se o conhecimento não é digno nem de consideração, o que deveríamos levar em conta para avaliar se a escola cumpre ou não o seu papel? 

Esse seu argumento revela que, apesar das negativas de gente como Demo, ele e os educadores que se encantam com suas ideias só estão preocupados em fazer da escola um instrumento de doutrinação ideológica anticapitalista, motivo pelo qual não estão nem aí se os alunos aprendem de fato alguma coisa ou não. É por isso que, na sequência do seu questionamento, você diz o seguinte: 

E é por estar em desacordo com o próprio "conteúdo" do que é ensinado e avaliado que o autor não pode confrontar dados como esse que você propõe com a tese que ele apresenta.


Pois é. Segundo você, ele não concorda que os conteúdos atualmente ensinados nas aulas de matemática, física, biologia, história, português, etc., sejam importantes e, sendo assim, manda jogar no lixo a Prova Brasil e outros testes que provarem o quanto os diagnósticos dele são errados para que fiquemos todos contentes com uma escola que ensine somente as ideologias e valores que ele pensa que são "do bem". 

Ademais, note que não há nada mais conveniente para um demagogo do que afirmar que os resultados da realização de uma utopia não são verificáveis objetivamente: assim, ele pode propor substituir os testes por instrumentos de avaliação subjetivos e corporativistas. Por exemplo, formar "comissões de avaliação" nas quais alguns representantes de alunos, professores e funcionários se juntam em volta de uma mesa, conversam durante horas e, ao final, sentenciam que tudo vai bem, obrigado, ou então declaram que a educação vai mal devido aos baixos salários e à falta de infraestrutura.

Quem vai dizer que não é assim mesmo que os defensores dessas "revoluções" do ensino raciocinam?

6 comentários:

  1. É desesperador...

    A tentativa de analisar o ambiente escolar sob uma ótica marxista (claro...) de "dominador" (o professor) e "dominado" (o aluno) produziu o conceito de "escola democrática", onde autoridade e disciplina não existem posto que tudo deve ser resolvido com "diálogo e debate de idéias".

    Junte-se a isso as noções de que pressão por resultados é uma prática "capitalista" (e portanto opressora) e de que o próprio currículo é um meio de dominação (isso me soa um tanto conspiratório para ser sincero...) e nós temos o resultado: uma escola onde muitas vezes (em verdade, na maioria das vezes) é impossível ministrar uma aula tamanha a indisciplina dos alunos, uma escola onde ninguém estuda, afinal nota baixa em prova é uma "agressão",e , finalmente, uma escola de onde saem nada mais do que iletrados, que não são capazes de entender ou produzir textos simples ou mesmo de efetuar contas de divisão!

    E, mesmo dado esse cenário calamitoso, os especialistas (de gabinete) nunca questionam as próprias teorias. Questionam os métodos de avaliação.

    É desesperador...

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    1. Meus parabéns pelo seu comentário! Embora eu não viva essa realidade, pois não sou professor do ensino médio e fundamental, é justamente esse quadro desalentador que eu verifico ao comparar os textos sobre educação que leio com os relatos dos professores que conversam comigo (vários deles, ex-alunos meus). A propósito, posso mandar o seu comentário para o site do Escola Sem Partido? E, se você for professor(a), posso dizer em qual cidade e séries você leciona?

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  2. Caro Luiz Diniz,

    Sinta-se a vontade para enviar o comentário para o Escola Sem Partido. Meu nome é Vitor Balestro e fui professor de Matemática em Niterói-RJ atuando principalmente em Ensino Médio. Me afastei da profissão por conta dos meus estudos de pós-graduação em matemática, e pretendo voltar para a sala de aula mas em nível superior.

    Qualquer coisa meu e-mail é vitorbalestro@id.uff.br.

    A propósito, parabéns pela belíssima iniciativa de manter um blog contestando o discurso ideológico travestido de pesquisa que insiste em se manter em voga em nossa academia.

    Abraços,

    Vitor

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  3. Perdoe-me pelo equívoco ao escrever seu nome com Z. Momento de falta de atenção hehe.

    Abraços,

    Vitor

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  4. DINIZ, veja só um perfeito exemplo de vaguidade a que te referes:

    " A inter-relação entre Geografia e Direito, seja no caso da construção e reconstrução do espaço, do aproveitamento dos recursos naturais, da proteção ao meio ambiente, da questão fundiária, do uso do solo urbano, da distribuição da renda e de muitas outras contradições que marcam o presente período histórico dificilmente serão resolvidos, se não houver um grande diálogo entre os saberes, um descortinamento objetivo da realidade social e uma educação não-disciplinar, que acreditamos ser uma exigência da contemporaneidade. "

    Mas o autor desta frase é um conhecido autor de livros didáticos. E para tantos como ele, o problema é justamente a disciplina enquanto saber ordenado. O correto seria a "educação não-disciplinar", ou seja, a falta de ordem, de estrutura conceitual, de método, um "liberou geral" onde não se chega a lugar nenhum, mas se auto-promove em cima da vaguidade.

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  5. É bem o tipo de coisa que o Demo escreveria. Esse pessoal enfeita o substantivo "conhecimento" com adjetivos bonitos, tais como "disruptivo", "rebelde" e "integrador", para depois concluir que tudo deve ser revolucionado desde a raiz mesmo sem haver nenhuma epistemologia que defina claramente como se constrói e se ensina o conhecimento nessa perpectiva "revolucionária".

    Mas, por incrível que pareça, esse tipo de proposta está sendo posta em prática no Campus Litoral da UFPR! Qualquer hora eu falo um pouquinho disso.

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